Mais uma cidade americana é consumida pelo caos diante
da morte de um homem negro em decorrência da ação de policiais brancos. Freddie
Gray, de 25 anos, veio a óbito após passar uma semana internado com lesões na
coluna, provocadas pela ação negligente e truculenta de agentes de segurança
pública enquanto era detido ilegalmente.
Um dia após a confirmação de sua morte, tiveram início em Baltimore as mais
violentas manifestações populares desde a década de 1960. Depois dos casos
Trayvon Martin em 2012 e Michael Brown e Eric Garner no ano passado, têm se
tornado cada vez mais recorrentes episódios de fúria popular, desencadeados
pela ação truculenta de policiais brancos contra homens negros nos EUA.
Desde a Guerra de Secessão, motivada
fundamentalmente pelo desentedimento entre Confederação e União em relação à questão
da escravidão, a tensão social entre negros e brancos tem sido uma constante
nos EUA. Como ocorreu na maioria das sociedades pré-Revolução Industrial com
sistemas econômicos baseados na servidão étnica, a maior parte dos ex-escravos libertos ao fim da mais mortal
guerra travada em território americano não foram adequadamente integrados à
sociedade. Como consequência, os negros se configuram atualmente como o segundo grupo étnico mais pobre nos EUA, logo atrás dos americanos de ascendência indígena. A situação econômica adversa, aliada a
um racismo renitente originado nas plantações de algodão de democratas sulistas, se converteu num
barril de pólvora, pronto para explodir de tempos em tempos. A apoteose desses
distúrbios se deu, sem dúvida, na segunda metade do século XX, quando políticas
segregacionistas institucionalizaram o racismo, relegando oficialmente os
negros à condição de cidadãos de segunda classe.
Décadas após a extinção do famigerado arcabouço
legal que tornava lei a segregação étnica nos EUA, as manifestações violentas
têm retornado com cada vez mais intensidade. Só que as circunstâncias são outras.
Se na década de 1960 os confrontos mais
agudos ocorreram em decorrência do assassinato de Martin Luther King Jr., hoje seu
exato oposto é a causa dos motins.
Não deixa de ser tragicamente irônico que os
distúrbios mais severos da segunda metade do século XX tenham sido causados
pelo assassinato covarde de um intelectual multi-premiado, adepto da filosofia
do satyagraha, e então mais jovem ganhador do Prêmio Nobel da Paz, enquanto
as ondas de saques e vandalismo do início do século XXI tenham origem em
previsíveis assassinatos de bandidos comuns. Luther King, um dos homens mais
importantes do século passado, deu sua vida para que as pessoas negras tivessem
um mínimo de dignidade nos EUA. Michael Brown foi morto num confronto com a
polícia, após ter assaltado uma loja de conveniência em Ferguson. Trayvon Martin, adolescente com histórico violento de posse de armas e uso de drogas, foi baleado por
agredir um vigilante comunitário. Freddie Gray tinha passagens na
polícia por múltiplos delitos como posse de drogas e destruição de propriedade privada.
Eric Garner, apesar de, como Gray, ser morto em decorrência de evidente excesso policial, também era um criminoso contumaz, acusado, dentre
outras condutas ilícitas, de assédio sexual, falsidade ideológica e posse de drogas.
Não que os assassinatos se justifiquem pela conduta
antissocial dos marginais. Longe disso. O que não pode ser ignorado é o
oportunismo rasteiro de setores midiáticos "progressistas" em apontar neles uma
suposta motivação racista da polícia. Tendo em mente que, nos EUA, os brancos são
as maiores vítimas dos excessos das forças de segurança, é
de se admirar porque apenas as mortes de bandidos negros causam
comoção generalizada e recebem atenção da grande mídia. Comparar, de alguma
forma, os recentes episódios de delinquência coletiva, perpetrados por uma turba
habilmente manobrada por arruaceiros disfarçados de jornalistas, com as Marchas
de Selma a Montgmery, é insultar a memória de gente da estatura de Martin
Luther King Jr. e Rosa Parks.
Muito pior do que a clara intenção de alguns
ideólogos do quebra-quebra em converter em manifestações de racismo a abordagem de
criminosos negros pela polícia, é o incomensurável utilitarismo despudorado de
políticos que utilizam os motins para reforçar sua agenda. Quando o homem que
carrega nas costas a honra e a responsabilidade de ser o primeiro chefe de
estado negro do maior país do mundo comete o destempero de dizer coisas como “Trayvon Martin could have been me, 35 years ago”, ele admite
abertamente o desprezo que sente pelo herói negro que, contra todas as
possibilidades, ignora as facilidades do crime (devidamente sancionadas pelos
“preocupados com o social” como cobranças da “dívida histórica” que os brancos
possuem em relação a eles) e luta pelo que é seu dentro das regras. Ao buscar
dividendos políticos se comparando a um criminoso comum, Barack Obama espezinha
o legado de Martin Luther King Jr (esse sim muito mais digno da posição de
primeiro presidente negro dos EUA do que um simples agitador que nunca teve um trabalho na vida), que deu sua vida para provar que é possível exigir direitos sem
recorrer à bandidagem ideologicamente “justificada”. Cada vez que usa o
expediente marxista da luta classes para acusar policiais de “Target Poors, African Americans”, ele automaticamente assume a
responsabilidade por qualquer degenerado que entenda suas provocações ideológicas
rasteiras como incitação ao assassinato de policiais brancos. Queira ou não, Obama tem as mãos sujas
de sangue.
Por ironia do destino, algumas semanas após o
incidente de Ferguson um jovem branco desarmado foi assassinado por um policial negro,
em clara demonstração de excesso de força policial. Uma pesquisa
rápida no Google por Dillon Taylor, Eric Garner, Trayvon Martin, Michael Brown ou Freddie Gray
mostra que, enquanto para o primeiro o que se apresenta de relevante são apenas
uma simples página de facebook exiginido justiça pelo assassinato, um artigo do
Daily Mail e uma postagem do Washington Times,
no caso dos outros, sem exceção, há artigos na Wikipedia sobre cada assassinato,
fotos (a maioria delas retratando-os em
expressões amigáveis, pra dizer o mínimo) e menções de algumas das maiores redações
europeias e americanas como The Guardian, CBS News, NBC News, BBC e Time. Há,
inclusive, uma fundação criada em memória de Trayvon Martin. Indagado sobre a
diferença entre as coberturas da CNN sobre Michel Brown
e Dillon Taylor, Jake Tapper, âncora da emissora, se limitou a
dizer que “We don’t cover a lot of things enough”. Das duas uma: ou o mainstrem jornalístico dos EUA anda meio
distraído fazendo proselitismo esquerdista, ou a vida de um negro vale mais que
a de um branco.
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