sexta-feira, 31 de julho de 2015

As Vítimas e as Marchas Pelos Direitos Civis do Século XXI



Mais uma cidade americana é consumida pelo caos diante da morte de um homem negro em decorrência da ação de policiais brancos. Freddie Gray, de 25 anos, veio a óbito após passar uma semana internado com lesões na coluna, provocadas pela ação negligente e truculenta de agentes de segurança pública enquanto era detido ilegalmente. Um dia após a confirmação de sua morte, tiveram início em Baltimore as mais violentas manifestações populares desde a década de 1960. Depois dos casos Trayvon Martin em 2012 e Michael Brown e Eric Garner no ano passado, têm se tornado cada vez mais recorrentes episódios de fúria popular, desencadeados pela ação truculenta de policiais brancos contra homens negros nos EUA.
Desde a Guerra de Secessão, motivada fundamentalmente pelo desentedimento entre Confederação e União em relação à questão da escravidão, a tensão social entre negros e brancos tem sido uma constante nos EUA. Como ocorreu na maioria das sociedades pré-Revolução Industrial com sistemas econômicos baseados na servidão étnica, a maior parte dos  ex-escravos libertos ao fim da mais mortal guerra travada em território americano não foram adequadamente integrados à sociedade. Como consequência, os negros se configuram atualmente como o segundo grupo étnico mais pobre nos EUA, logo atrás dos americanos de ascendência indígena. A situação econômica adversa, aliada a um racismo renitente originado nas plantações de algodão de democratas sulistas, se converteu num barril de pólvora, pronto para explodir de tempos em tempos. A apoteose desses distúrbios se deu, sem dúvida, na segunda metade do século XX, quando políticas segregacionistas institucionalizaram o racismo, relegando oficialmente os negros à condição de cidadãos de segunda classe.
Décadas após a extinção do famigerado arcabouço legal que tornava lei a segregação étnica nos EUA, as manifestações violentas têm retornado com cada vez mais intensidade. Só que as circunstâncias são outras. Se na década de 1960  os confrontos mais agudos ocorreram em decorrência do assassinato de Martin Luther King Jr., hoje seu exato oposto é a causa dos motins.
Não deixa de ser tragicamente irônico que os distúrbios mais severos da segunda metade do século XX tenham sido causados pelo assassinato covarde de um intelectual multi-premiado, adepto da filosofia do satyagraha, e então mais jovem ganhador do Prêmio Nobel da Paz,  enquanto as ondas de saques e vandalismo do início do século XXI tenham origem em previsíveis assassinatos de bandidos comuns. Luther King, um dos homens mais importantes do século passado, deu sua vida para que as pessoas negras tivessem um mínimo de dignidade nos EUA. Michael Brown foi morto num confronto com a polícia, após ter assaltado uma loja de conveniência em Ferguson. Trayvon Martin, adolescente com histórico violento de posse de armas e uso de drogas, foi baleado por agredir um vigilante comunitário. Freddie Gray tinha passagens na polícia por múltiplos delitos como posse de drogas e destruição de propriedade privada. Eric Garner, apesar de, como Gray, ser morto em decorrência de evidente excesso policial, também era um criminoso contumaz, acusado, dentre outras condutas ilícitas, de assédio sexual, falsidade ideológica e posse de drogas.   
Não que os assassinatos se justifiquem pela conduta antissocial dos marginais. Longe disso. O que não pode ser ignorado é o oportunismo rasteiro de setores midiáticos "progressistas" em apontar neles uma suposta motivação racista da polícia. Tendo em mente que, nos EUA, os brancos são as maiores vítimas dos excessos das forças de segurança, é de se admirar porque apenas as mortes de bandidos negros causam comoção generalizada e recebem atenção da grande mídia. Comparar, de alguma forma, os recentes episódios de delinquência coletiva, perpetrados por uma turba habilmente manobrada por arruaceiros disfarçados de jornalistas, com as Marchas de Selma a Montgmery, é insultar a memória de gente da estatura de Martin Luther King Jr. e Rosa Parks.
Muito pior do que a clara intenção de alguns ideólogos do quebra-quebra em converter em manifestações de racismo a abordagem de criminosos negros pela polícia, é o incomensurável utilitarismo despudorado de políticos que utilizam os motins para reforçar sua agenda. Quando o homem que carrega nas costas a honra e a responsabilidade de ser o primeiro chefe de estado negro do maior país do mundo comete o destempero de dizer coisas como “Trayvon Martin could have been me, 35 years ago”, ele admite abertamente o desprezo que sente pelo herói negro que, contra todas as possibilidades, ignora as facilidades do crime (devidamente sancionadas pelos “preocupados com o social” como cobranças da “dívida histórica” que os brancos possuem em relação a eles) e luta pelo que é seu dentro das regras. Ao buscar dividendos políticos se comparando a um criminoso comum, Barack Obama espezinha o legado de Martin Luther King Jr (esse sim muito mais digno da posição de primeiro presidente negro dos EUA do que um simples agitador que nunca teve um trabalho na vida), que deu sua vida para provar que é possível exigir direitos sem recorrer à bandidagem ideologicamente “justificada”. Cada vez que usa o expediente marxista da luta classes para acusar policiais de Target Poors, African Americans, ele automaticamente assume a responsabilidade por qualquer degenerado que entenda suas provocações ideológicas rasteiras como incitação ao assassinato de policiais brancos. Queira ou não, Obama tem as mãos sujas de sangue.
Por ironia do destino, algumas semanas após o incidente de Ferguson um jovem branco desarmado foi assassinado por um policial negro, em clara demonstração de excesso de força policial. Uma pesquisa rápida no Google por Dillon Taylor, Eric Garner, Trayvon Martin, Michael Brown ou Freddie Gray mostra que, enquanto para o primeiro o que se apresenta de relevante são apenas uma simples página de facebook exiginido justiça pelo assassinato, um artigo do Daily Mail e uma postagem do Washington Times,  no caso dos outros, sem exceção, há artigos na Wikipedia sobre cada assassinato, fotos  (a maioria delas retratando-os em expressões amigáveis, pra dizer o mínimo) e menções de algumas das maiores redações europeias e americanas como The Guardian, CBS News, NBC News, BBC e Time. Há, inclusive, uma fundação criada em memória de Trayvon Martin. Indagado sobre a diferença entre as coberturas da CNN sobre Michel Brown e Dillon Taylor, Jake Tapper, âncora da emissora, se limitou a dizer que We don’t cover a lot of things enough. Das duas uma: ou o mainstrem jornalístico dos EUA anda meio distraído fazendo proselitismo esquerdista, ou a vida de um negro vale mais que a de um branco. 

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