O advento da Modernidade, no entanto, operou uma mudança drástica no modo como o mundo físico vinha sendo interpretado até então. A gênese filosófica do giro de 180º que o pensamento ocidental experimentaria daí em diante remete a dois filósofos em particular: René Descartes e Guilherme de Ockham. A partir de então, a interpretação do mundo não mais estaria sujeita à tirania da realidade objetiva. Daí em diante a tônica do pensamento ocidental seria a concepção do mundo como idéia.
O pensamento cartesiano inaugurou
a filosofia moderna ao enfatizar a componente do ceticismo. Em seu Discurso Sobre o Método, Descartes
propõe rejeitar como falso tudo aquilo sobre o que se possa ter qualquer
resquício de dúvida. Haja vista a já referida fragilidade dos órgãos sensoriais
humanos e a facilidade com que a percepção da realidade pode ser alterada, a
conseqüência lógica desse tipo de proposta é uma só: um mundo cuja única
certeza é que tudo é arbitrário. Se juntar dez pessoas afirmando que uma poltrona
e um réptil neozelandês são a mesma coisa é suficiente para fazer alguém
questionar os próprios olhos, e se isso atesta que não se pode ter certeza de
nada, então o mundo se torna algo completamente aleatório e imprevisível. Não
há mais padrões em que se basear para interpretar a realidade.
Essa não foi a única contribuição
do francês para o atual estado de coisas. Ao inverter causa e conseqüência
tornando a realidade produto da mente humana, seu slogan “Penso, logo existo” se
converteu no fiat lux da modernidade.
Ora, a mais trivial experiência empírica atesta o exato oposto: ao mundo físico
pouco importa o que alguém pensa, as coisas são como são. Uma pedra não precisa
pensar para existir. Levando ao limite a proposição cartesiana, o que se vai
conseguir é adentrar o pântano autista do solipsismo, concepção segundo a qual nada
existe fora do pensamento individual, não passando o entorno de mero produto da
imaginação.
Guilherme de Ockham também deu
sua parcela de contribuição no esforço de tornar elástica a realidade objetiva
ao introduzir a teoria do nominalismo. A principal característica dessa escola
de pensamento é, justamente, a negação da existência dos Universais. A
conseqüência lógica dessa proposição não poderia ser outra: se não é possível
conceber um conjunto de propriedades para identificar cada elemento da
realidade e discriminá-lo dos demais diferentes dele, simplesmente qualquer
coisa pode ser qualquer coisa. Em outras palavras, a verdade objetiva não
existe. Ou, no jargão politicamente correto, “cada um tem sua própria verdade”.
A partir de então, o conhecimento, que sempre fora ancorado na observação honesta da realidade objetiva, passou, nas palavras certeiras de Anthony Esolen, a significar nada menos do que o manejo dos fatos a serviço do poder. Abriu-se, então, a caixa de Pandora para a manipulação ostensiva do mundo físico com propósitos políticos. A realidade migrou do mundo exterior para o interior da mente humana. Chegou-se, então, ao tempo profetizado por Chesterton, em que seria necessário provar que a grama é verde. E isso tem se tornado cada vez mais literal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário